sexta-feira, 6 de março de 2015

ENTENDER O “PRÓXIMO” E O “DISTANTE” NA LEITURA DO GRAND TABLEU LENORMAND – MANUAL PRÁTICO III

O Das Spiel der Hoffnug, segundo o nosso conhecimento actual, é o “proto petit-Lenormand, um jogo criado por Johann Kaspar Hechtel, em 1799 e publicado por G. P. J. Bieling, em Nuremberga, Alemanha. Os cartões foram publicados como LeNormand, pela primeira vez, em 1846, por J. F. August Reiff, em Koblenz.
Ler o petit-Lenormand é acessível a todos, sinta as cartas com os seus significados e naipes em relação a si, objective o contexto e verifique as condições meteorológicas apresentadas. Leia as cartas por justaposição, a leitura petit-Lenormand funciona por associação de semantemas, para construir um corpus linguístico. Uma carta isolada, assim como um órgão humano, não sobrevive, ela precisa de comungar com o corpus, para se materializar e activar.
O método NFM (“Near & Far”), aparentemente complicado e “desactualizado”, é um método extremamente riquíssimo e pormenorizado, que permite uma macro-abrangência temática e o continuum dinâmico, que caracteriza o petit-Lenormand. Pensemos num epicentro, o significador e, a partir dele, vamos verificar a influência/ não influência da proximidade/afastamento da polaridade do cartão em relação ao mesmo. Na abordagem anterior, apresentei as cartas 01, 09, 15, 18, 20, 21 22, 31, 32, 34, 01, 09, 16, 17, 19 e 23. Hoje a abordagem incide sobre as cartas n.º 03, 06, 07, 10, 11 e 14.
O Navio, cartão n.º 03, é apresentado por “Philippe” LeNormand, como “ o Símbolo do Comércio, o indicador de uma grande oportunidade de “produzir riqueza”, materializada por intercâmbio comercial ou uma herança; próximo [do cartão] da Pessoa, viagem anunciada”. Produtividade material e deslocação de longa duração são, pois, os significados primevos, na interpretação da carta. Produtividade como consequência de OPORTUNIDADE(S) presente(s) de praticar empreendedorismo e “fazer dinheiro” e viagem de longa duração, pela conotação do navio, como veículo de locomoção intercontinental, podendo ser aplicado, na actualidade, a linhas aéreas intercontinentais. O afastamento do cartão da carta da Pessoa [n.ºs 28 & 29] vai diminuir a intensidade da interface [=comunicação] e, é neste contexto, que surge a significação de “saudade”, aplicada aos relacionamentos. Pense no Navio como a oportunidade de produzir e frutificar[-se]; a proximidade é determinante no fazeamento e realização da mesma.
As Nuvens oferecem NEGATIVIDADE em qualquer posicionamento, embora a mesma seja minimizada com o afastamento do cartão da Pessoa. Leio a circunvizinhança desta carta como o cancer do contexto e a(s) dificuldade(s) major(es) existente(s) na vida do/a querente. Todo e qualquer cartão, sob as condições meteorológicas desfavoráveis do Soberano de Paus (o Bad King), é afectado, enfraquecido e, mesmo, adquire uma polaridade inversa (estão nestas situações o Trevo, as Estrelas, a Torre e os Caminhos, principalmente). As cartas localizadas à direita (ou sobre a influência do lado “clouded”) e sob as mesmas são as mais directamente influenciadas.Esta situação, em termos práticos, é cientificada, se observar a realidade. A esquerda, no século XIX e, ainda no século XX, era considerada a direcção “não dominante”, “a fraca” (recorde que nas Escrituras cristãs a esquerda é sinonímia de fraqueza); inversamente, a direita, a dextra, era conotada como a “dominante”, a “correcta” (recorde o excerto bíblico
"O Senhor Jesus, depois de ter falado com eles, subiu aos Céus e está sentado à dextra de Deus" (Mc 16, 19)). In illo tempore, as pessoas percepcionavam a realidade dualisticamente, mergulhadas na cultura eminentemente judaico-cristã. A polaridade “luz/trevas” era o agente socializador major. Atente ainda que o Dondorf oferece o lado “escuro” do cartão numa direcção oposta à apresentada pela CartaMundi, por exemplo. O curioso é verificarmos que até meados do século XX, PICTOGRAFICAMENTE, o “olhar” do Rei apresentava-se, sempre, direccionado para o lado “obscuro” do cartão. A questão do cartão influenciar as cartas “sob” o mesmo, na minha leitura, faz referência ao que, na prática, podemos dizer, pleonasticamente, chover “para baixo”. Esta questão permite um estudo mais pormenorizado e, o meu objectivo, é apresentar uma explanação prática, sintética e objectiva dos cartões aplicados à realidade.
A Serpente, sob a égide da Soberana de Paus, traduz PERIGOSISADE, “perigo esse, que adquire maior ou menor intensidade, dependentemente do maior ou menor distanciamento [do cartão] da Pessoa”. O ofídio lenormândico alerta, sinaliza, revela a presença de uma situação onde uma intervenção imediata se faz necessária, pois “ a decepção, a infidelidade e o ferimento estão, invariavelmente, próximos”. Inteligência e conhecimento adquirido pela experiência de vida são também “essências” deste cartão, por isso a figura primeira traduzida pela carta seja uma mulher já de idade e, brasonada com o naipe mais desagradável, figura essa fatalmente pragmática, sem os olhares rosáceos de uma adolescente com borboletas a pupular no estômago. A Serpente mortifica sim, mas só quando incomodada. Se ela se hospedar próximo do seu cartão, ela traduz a sinalização de perigo iminente. Quanto mais próxima, maior é a intensidade do perigo. Contrariamente à Raposa, e aqui a diferença entre as duas é significante, a Serpente manifesta o alerta, enquanto a Raposa já lhe “puxou o tapete”.
A Foice, “[próxima do cartão da Pessoa] manifesta um grande perigo, situação essa só mitigada pela presença de cartas favoráveis”. O perigo apresentado é diminuído pelo afastamento. Objectos e situações cortantes e sinistralizadoras bem longe, assim é na vida, pelo menos, assim o desejamos. O lado laminado do objecto agricola sinistra e corta o objecto posterior. O cartão é, intrinsecamente, um dos mais perigosos e impacáveis, a conjuntura de PERIGO IMINENTE E CASTRADOR é uma realidade.
O Chicote, naipeado pelo Valete de Paus, sinaliza “conflituosidades, antagonismos e variáveis perturbadoras para os seus relacionamentos familiares e próximos” (a tradução adaptada do LWB de “Philippe LeNormand” é da minha autoria). Látego, acoite, verga e vergalho aparecem como sinónimos de chicote, estes dois último, na minha opinião e nos estudos realizados, a origem da conotação fálica e BDSM associadas ao cartão. A carta traduz iteractividade, uma acção continuada e frequentativa, um iterar de “a want of peace among...persons”. “Pilippe” indica o cartão também como um profecta de “febres e doenças prolongadas”.
A Raposa materializa FALSIDADE, ela traduz factualmente um contexto de não confiabilidade, porque “próxima [do cartão da pessoa] é o epicentro da presença de pessoas não confiáveis, com a qual você mantêm conectividade; ...algumas delas TENTAM prejudicá-lo/a” (tradução uma vez mais adaptada e da minha autoria). Verifique que o texto diz, ipis verbis, “TENTAM”, numa situação de relidade-factualidade. O vulpídeo, apesar de “fluffy” e “fofinho”, era para os Germanos, associado ao deus LOKI, o ENGANADOR. Um contexto astronomicamente antagónico ao apresentado por Saint-Exupéry, n`O Principezinho. A Raposa é um predador e uma estrategista, par excellence. Ela articula por INTENCIONALIDADE, inversamente à Serpente, que actua por SOBREVIVÊNCIA e ao Urso, que ataca por INSTINTIVIDADE. “Philippe” diz que “distante, não há perigo a percepcionar”.
Comentários, rectificações e um feedback construtivo são sempre bem-vindos, como tenho afirmado desde que lancei a primeira “pedra” deste projecto.
Atenciosamente,
Jorge Silva

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